Motivação, ação e sensibilidade

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Quando falamos em planejamento de carreiras, cotidiano em empresas entre outros temas empresariais geralmente nos esquecemos do fundamento do trabalho: o salário. Trabalhar é inevitável para a maioria absoluta da população por questões de subsistência. Mesmo assim, é preciso refletir antes de começar. Precisamos descobrir dentro de nós onde está a motivação, a engrenagem mestra daquilo que ocupará grande parte da nossa vida. Nesses casos, a necessidade deve estar intimamente ligada com o desejo, com a projeção de futuro que queremos.

Profissionais de RH primam pelo conhecimento desenvolvido de seus candidatos – e com razão. Porém, o gênero humano é, em seu princípio, elementar. No mundo animal, o coletivo obedece a um indivíduo dominante por instinto e necessidade. Nós não funcionamos assim: as pessoas estudam para tornarem-se menos primais, menos brutas, e, portanto, obedecer e dar ordens é uma relação complexa, ainda mais se dessa relação depende, assim como nos animais, a nossa subsistência.

Quando um profissional é contratado, existe um mútuo acordo entre a empresa e o futuro funcionário. Esse acordo tem de ser convergente, complementar. Existe sim a venda de uma competência, mas cabe ao gestor administrá-la de forma tão humana quanto racional. Não se trata de pregar uma anarquia, mas a relação custo-benefício deve ser equilibrada para todos.

Em casos em que a obediência toma o lugar da colaboração, o desgaste, estresse e pressão são grandes demais e é chegada a hora de procurar uma empresa que se encaixe melhor com o seu perfil. Um bom exemplo, que na verdade constitui uma exceção que elucida a regra, são os estagiários.

Para eles, a obediência é conseqüência do aprendizado a que se propõe durante um período. Quando a experiência já lhe permite refletir e opinar sobre suas obrigações, a relação decai e é hora de partir para uma outra fase.

Cabe ao gestor promover constantemente um espaço aberto à discussão com seu funcionário.

Identificadas as intenções futuras, o gestor deverá ou mudar sua estratégia de comunicação, ressaltando os pontos em comum entre empresa e funcionário ou, em casos de crise profunda, a ruptura se torna iminente para o crescimento da empresa.

Às vezes, resolver um mal estar interno pode ser muito simples. Ações fúteis, como oferecer uma vaga no estacionamento ou alguma vantagem não prevista no contrato inicial podem gerar um resultado maior do que se imagina. A lógica dessa missão é relativamente simples: quando passamos por um complexo comercial, é comum vermos várias lojas que oferecem o mesmo produto. Mas o que faz com que o cliente constante prefira a farmácia X ou a Y, por exemplo, sendo uma ao lado da outra? Na maioria das vezes, quem gera a fidelidade do cliente é o atendimento. Num ambiente corporativo, os funcionários também precisam ser fidelizados. É isso que irá promover ou renovar o comprometimento entre as partes.

Para que essa renovação aconteça, no entanto, é preciso que o gestor tenha visão e sensibilidade para entender o clima organizacional por onde circula, bem como a compreensão de que este não é o único ambiente funcional das pessoas que são suas parceiras. A motivação é um reflexo da preocupação do todo com o indivíduo. Uma mulher que está amamentando, por exemplo, precisa ter condições para dar seguimento a essa importante fase de sua vida. Se não forem criadas essas condições, ela sofrerá física e emocionalmente, dificultando tanto sua produtividade em trabalho como sua disposição doméstica. Por isso um cargo de gestão deve ser ocupado por uma pessoa com sensibilidade aguçada.

Em contrapartida, o funcionário que se encontra em uma situação delicada também precisa analisar sua parte. Muitas vezes, os objetivos pessoais coincidem com o da empresa, mas empecilhos relacionais podem dificultar a realização plena dos desejos. Nesses casos, ele precisa trabalhar mentalmente (por si só ou com a ajuda de um profissional) para melhorar sua capacidade de síntese e desta forma poder relevar com mais tranqüilidade as situações desagradáveis. É preciso ter consciência de que sempre temos que abrir mão de algo para chegar onde queremos e que o prazer em trabalhar é algo que se conquista. E como toda a conquista, o processo requer uma porção de sofrimento. Para quem quer crescer, a palavra é tolerância.

*Leonard F. Verea, médico psiquiatra formado pela Faculdade de Medicina e Cirurgia de Milão, Itália. Especializado em Medicina Psicossomática e Hipnose Clínica

Leonard F. Verea | Fonte: O Estado de S. Paulo

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